PARA HELENA
Vi-te uma vez, só uma, há vários anos,
já não sei dizer QUANTOS, mas NÃO MUITOS.
Era em junho; passava a meia-noite
e a lua, em ascensão, como tua alma,
nos céus abria um rápido caminho.
O luar caía, um véu de seda e prata,
calma, tépida, embaladoramente,
em cheio, sobre as faces de mil rosas,
que floreciam num jardim de fadas,
onde até o vento andava de mansinho.
Caía o luar nas faces dessas rosas,
que morriam, sorrindo, no jardim
pela tua presença enfeitiçado.
Toda de branco, vi-te reclinada
sobre violetas; e o luar caía
sobre as faces das rosas, sobre a tua,
voltada para os céus, ai! de tristeza!
Não foi o Destino, nessa meia-noite,
não foi o Destino (que é também Tristeza)
que me levou a esse jardim, detendo-me
com o incenso das rosas que dormiam?
Nenhum rumor. O mundo silenciava.
Só tu e eu (meu Deus! Como palpita
o coração, juntando estas palavras!) ...
Só tu e eu... Parei... Olhei...
E logo todas as coisas se desvaneceram.
(Lembra-te: era um jardim enfeitiçado.)
Fugiu a luz de pérola da lua.
Os canteiros, os meandros sinuosos,
flores felizes, árvores aflitas,
tudo se foi; o próprio odor das rosas
morreu nos braços do ar que as adorava.
Tudo expirara... Tu ficaste... Menos
que tu: a luz divina nos teus olhos,
a alma nos olhos para os céus voltados.
Só isso eu vi durante horas inteiras,
até que a lua fosse declinando.
Ah! que histórias de amor se não gravavam
nas celestes esferas cristalinas!
que mágoas! Que sublimes esperanças!
que mar de orgulho, calmo e silencioso!
e que insondável aptidão de amar!
Mas, afinal, Diana se sepulta
num túmulo de nuvens tormentosas.
Tu, como um elfo, entre árvores funéreas,
deslizas, Só TEUS OLHOS PERMANECEM.
NÃO QUISERAM fugir e não fugiram
Iluminando a estrada solitária
de meu regresso, não me abandonaram
como fizeram minhas esperanças.
E ainda hoje me seguem, dia a dia.
São meus servos – mas eu sou seu escravo.
Seu dever é luzir em meu caminho;
meu dever é SALVAR-ME por seu brilho,
purificar-me em sua flama elétrica,
santificar-me no seu fogo elíseo.
Dão-me à alma Beleza (que é Esperança).
Astros do céu, ante eles me prosterno
nas noites de vigília silenciosa;
e ainda os fito em pleno meio-dia,
duas Estrelas-d'Alva, cintilantes,
que sol algum jamais extinguirá.
(Edgar Allan Poe)